O Continente Americano decorre da Espanha (Península Ibérica) e o Brasil também, via Portugal, como um espelho em que se reflete tanto a realidade quanto um projeto da imaginação, onde se queria construir uma sociedade perfeita. A descoberta da América deu-se no final do século XIV, como marco que encerrou a Idade Média e iniciou o Renascimento e a Idade Moderna. A América não existe ela foi inventada pelos espanhóis para sedimentar um projeto humano/divino que deveria se unir harmonicamente ou seja a Utopia (óu topos que é um não lugar).
O Espelho Enterrado é um dos últimos livros do Escritor mexicano, Carlos Fuentes, um dos maiores da língua Espanhola, falecido no ano de 2006 – Editora Rocco/2001. Ele faz uma reflexão sobre a Espanha e o Novo Mundo. Nele vamos encontrar a explicação para um dos maiores dramas em que a vive a América Latina: a corrupção.
“A figura do corriegidor, era um coletor de impostos, magistrado e administrador, cujos lábios serviam à coroa, mas cujas mãos estavam submersas em conluios com os poderes locais dos donos de haciendas e dos caciques políticos.
Não admira, pois, que quando novas leis humanitárias chegaram da Espanha ao Novo Mundo, os funcionários locais simplesmente as colocassem no alto de suas cabeças, declarando solenemente: La lei se obedece pero no se cumple, isto é, a lei é formalmente acatada, mas verdadeiramente menosprezada. Assim se desenvolveu, na América Latina, um profundo divórcio entre o país legal, consagrado na legislação monárquica e, mais tarde, nas constituições republicanas, e o país real, apodrecendo por trás da fachada legal, contribuindo para a desmoralização e o despedaçamento da América espanhola desde o início”. (pg. 136).
O livro faz uma profunda reflexão sobre os quinhentos anos do descobrimento da América e chega à conclusão de que não temos nada a comemorar: “Inflação, desemprego, peso excessivo da dívida externa. Pobreza e ignorância crescentes; abrupto declínio do poder aquisitivo e dos padrões de vida. Um sentimento de frustração, de ilusões perdidas e esperanças despedaçadas. Democracias frágeis, ameaçadas pela explosão social”.
Para o referido autor, o Continente Latino Americano tem uma cultura riquíssima - que criamos com o maior alegria, com a maior gravidade, e maior risco - decorrente de índios, negros e descendentes de europeus, mas desassociada da política e da economia e, daí a nossa incapacidade de prosperar, pois buscamos modelos de desenvolvimento com pouca ou nenhuma relação com a nossa cultura. “Mas é por isso, também, que a redescoberta dos valores culturais talvez possa nos dar, com esforço e um pouco de sorte, a visão necessária das coincidências entre a cultura, a economia e a política. Quem sabe seja esta a nossa missão no século vindouro”(pag. 10).
Renato Gomes Nery. E-mail – [email protected]