KARINE ARRUDA
DO REPÓRTER MT
Há cerca de 30 dias, mais de 3 mil lojistas se viram 'à beira do abismo', tendo que se despedir abruptamente de um sonho que conquistaram com muita luta e suor. Na madrugada de 15 de julho, o Shopping Popular de Cuiabá foi destruído por um incêndio que tomou conta de tudo em pouquíssimo tempo. Lojas, produtos, mercadorias, placas, objetos, paredes, forros, pilastras, tudo, absolutamente tudo foi consumido pelo fogo. As chamas destruíram toda a estrutura predial do camelódromo, que ficou em ruínas.
Mas depois desse período, como está a vida dos comerciantes?
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Neste conteúdo especial, o RepórterMT relembra a tragédia que destruiu mais de 600 lojas do espaço comunitário que existe há quase 30 anos, conhecido como Shopping Popular, e traz também a realidade das pessoas que ainda permanecem firmes, buscando um forma improvisada para continuar vivendo e lucrando com o pouco que sobrou. Em entrevistas exclusivas, lojistas comentam sobre a queda drástica no faturamento e a luta diária do “monta e desmonta” para atender os clientes.
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João Kuszera - Proprietário da loja Yasmim Imports.
Confira:
Criado em 21 de abril de 1995, o Shopping Popular ainda nem era conhecido como shopping. Antigamente, o local era famoso por “camelódromo” ou “paraguaizinho”. Foi perto dessa época, cerca de 4 anos depois, que João Kuszera dava início a sua primeira loja no camelô, que depois se tornaria a Yasmim Imports.
No começo, o proprietário trabalhava com a venda de brinquedos e eletrônicos, mas, tempos depois, passou a comercializar produtos de tabacaria. Ele conta que, após a reforma do Shopping Popular, ocorrida em 2015, ou seja, cerca de duas décadas depois da construção, seu principal objetivo era manter alugado os boxes que havia comprado para que pudesse investir na sua aposentadoria, porém, após o incêndio, ele precisou voltar para as ruas.
“Eu tinha uma expectativa de vida diferente, mas como essa tragédia veio, mudou meus planos. Hoje eu tô na rua, expondo minha mercadoria, trazendo e levando, um cansaço enorme. As vendas não estão boas, estão muito fracas. Vou te falar a verdade, não dá lucro não, mas é pra gente manter a nossa classe aqui dentro”, conta o proprietário.
Segundo ele, além de todo o esforço para trazer e levar as mercadorias, o faturamento também não tem ajudado. Financeiramente falando, João conta que perdeu cerca de 70% das vendas após a destruição: “A expectativa que tinha dentro do Shopping era de 80%. Hoje, aqui, nós estamos com 10%. Não tem estacionamento para cliente. Qual cliente que chega num lugar desse para deixar o carro a 500 metros, andar no sol quente? É 10% do movimento, é muito pouco”.
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Adiely Pereira - Funcionária da loja Rabello Capas e Cia.
Quem também tem partilhado dessa rotina é Adiely Pereira, que atua no camelódromo há quase 8 anos e, atualmente, é funcionária da loja Rabello Capas e Cia. “Tá sendo bem cansativo. A gente chega de manhã, monta as mercadorias, monta as mesinhas e, no final do dia, tem que levar pra casa porque ainda não temos um local específico para deixar”, relata.
A expectativa dela e dos demais comerciantes é de que, nos próximos dias, eles saiam da Avenida Carmindo de Campos, onde estão trabalhando atualmente, e possam se alojar no estacionamento do Shopping Popular, onde poderão manter suas mercadorias guardadas, sem a necessidade do “monta e desmonta”. “Já tem um local específico, a gente vai para dentro do estacionamento do Shopping Popular, que é o nosso lar, não tem outro lugar pra gente poder ir. E o prazo estimado para gente estar lá dentro é no máximo uns 10 dias”, comenta.
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Lediane Oliveira - Proprietária da loja Leda Sunglass.
Junto de João e Adiely também está Lediane Oliveira, que trabalha no camelô desde os 16 anos e, há pouco mais de 12 anos, é dona da loja Leda Sunglass. Em entrevista ao RepórterMT, ela conta que não têm sido dias fáceis, ainda mais por conta da falta de energia e do calor. “Não está sendo fácil. Antigamente, a gente chegava, era só levantar a porta da loja e já estava com a loja aberta para atender os clientes. Agora não, a gente tem que vir mais cedo e montar para atender a população. Às 17h a gente já começa a fechar porque não tem energia, a gente tá aqui no calor”.
Assim como os demais, Leda não quis calcular o quanto perdeu após o incêndio. Para ela, essa é uma memória ruim, que não dá para mensurar. “Eu não quis fazer porque é muito triste tudo o que a gente passou. Um dia você está com a sua loja, no outro dia você já não tem nada. Eu não quis calcular, mas eu sei que eu perdi tudo. Estamos começando do zero”.
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Marcos Rondon - Proprietário da loja Batata Sound.
Porém, mesmo diante de tanta dificuldade, perdas e recomeços, ainda há quem pense ou pelo menos tente pensar positivo para continuar vivendo. “A gente tem que agradecer a Deus que foi um livramento, o incêndio aconteceu de madrugada, o que perdemos foi só mercadoria e estamos aqui, guerreiros, trabalhando”, relata Marcos Rondon, que trabalha no Shopping Popular há 22 anos e atualmente é dono do Batata Sound.
Relembre
Era cerca de 2h20 da madrugada de 15 de julho quando as câmeras de segurança internas registraram as primeiras imagens da fumaça que se espalhou pelo prédio onde funcionava o Shopping Popular. Naquela madrugada, cerca de 20 minutos depois, um dos seguranças que trabalhava no local acionou o Corpo de Bombeiros, que chegou ao camelódromo em apenas 7 minutos, porém já era tarde.
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Naquele momento, as chamas já haviam se espalhado rapidamente pelo prédio, se misturando aos produtos inflamáveis que haviam no local e intensificado ainda mais a potência do fogo. Os militares ainda tentaram conter o incêndio, mas a proporção era tamanha que em poucas horas as mais de 600 lojas já estavam debaixo dos escombros.
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Até o momento, o Corpo de Bombeiros e a Polícia Civil ainda não identificaram o que originou o fogo. A única informação repassada é de que o segurança local relatou ter visto a fumaça saindo entre o forro e a laje do piso superior. Nesse espaço, estavam localizadas fiações elétricas e a tubulação de água do estabelecimento.
Impasse
Após a tragédia, o Governo do Estado, a Prefeitura de Cuiabá e alguns parlamentares, como vereadores, deputados estaduais e federais e senadores, se mobilizaram para ajudar na reconstrução do espaço. A princípio, o executivo municipal sugeriu que os comerciantes ocupassem o campo e a pista de atletismo do Complexo Dom Aquino, que fica anexo ao shopping. Porém, o Ministério Público de Mato Grosso (MPMT) negou a autorização, argumentando que o espaço é de "interesse público" e não deve atender interesses privados.
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Diante desse impasse, pouco mais de 100 lojistas seguem, desde o dia 20 de julho, ocupando provisoriamente a calçada e meia pista da Avenida Carmindo de Campos, na região do bairro Dom Aquino, com a expectativa de que, dentro de 10 dias, possam oficialmente se alojar no estacionamento do Shopping Popular, no espaço que já era destinado a eles.
Entretanto, enquanto isso, para que não fiquem completamente desamparados, o poder público se uniu para ceder linhas de crédito aos comerciantes até que a reinauguração do camelô seja concluída, o que está previsto para abril de 2025. Então, segundo o presidente da associação do Shopping Popular, Misael Galvão, a Prefeitura de Cuiabá cedeu aos lojistas um capital de giro de R$ 5 mil a R$ 25 mil. Já o Governo do Estado, através do MT Desenvolve, liberou uma linha de crédito para os associados. E por fim, o Governo Federal decidiu subsidiar parte do empréstimo disponibilizado aos lojistas, com carência e juros irrisórios, parecido com o que foi feito no Rio Grande do Sul.
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