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Cuiabá, 15 de Novembro de 2024
15 de Novembro de 2024

25 de Setembro de 2024, 17h:37 - A | A

OPINIÃO / JORGE HENRIQUE FRANCO GODOY

Punição rápida, nem sempre é justa

JORGE HENRIQUE FRANCO GODOY



O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela execução imediata da pena imposta pelo Tribunal do Júri. Segundo o entendimento da Corte, a soberania das decisões do Júri Popular, prevista na Constituição Federal, justifica a prisão imediata dos condenados após a decisão, independente da pena aplicada. Essa interpretação levanta sérias preocupações sobre o respeito aos direitos e garantias fundamentais, em especial ao princípio da presunção de inocência.

O Tribunal do Júri, composto por cidadãos leigos, é considerado uma expressão máxima da democracia no sistema de justiça criminal brasileiro. A soberania de suas decisões, prevista no artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal, visa garantir que o veredicto popular seja respeitado e que a vontade do corpo de jurados não seja facilmente desfeita por instâncias superiores.

Por outro lado, o mesmo artigo 5º, em seu inciso LVII, assegura que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória". Esse é o princípio da presunção de inocência, um dos pilares do Estado Democrático de Direito, que impede a execução da pena antes que todos os recursos cabíveis sejam julgados.

Merece destaque a divergência aberta pelo ministro Gilmar Mendes, de que a soberania das decisões do júri popular não é absoluta, e, em observância ao princípio da presunção da inocência, a pena só pode começar a ser cumprida após a sentença condenatória definitiva, quando não couber mais recursos. Porém, lembrou muito bem que é possível decretar a prisão preventiva logo após o final do júri, caso o juiz considere necessário. Infelizmente, foi voto vencido.

Como advogado criminalista, atuante nesta área há quase 25 anos, já tendo realizado mais de 700 júris populares, afirmo que há sim muitos erros nos processos, júris que terminam com condenações contrárias às provas dos autos, falhas que infringem nossa legislação. E, se temos uma legislação, ela precisa ser cumprida.
Respeitamos em muito os familiares das vítimas, mas entendemos que o STF, em sua maioria, com essa decisão teratológica rasgou de vez a Constituição Federal ao atropelar o devido processo legal.

A decisão do STF, de fato, causa muita preocupação. A execução imediata da sentença é a culpabilidade definitiva ao réu, antes mesmo de todas as possibilidades de revisão judicial serem exauridas.

Essa decisão pode se tornar um instrumento de punição rápida, porém nem sempre justa, lembrando em muito, guardadas as devidas proporções, a tão famigerada “Lei de Lynch".

É de extrema importância lembrar que a complexidade do sistema recursal brasileiro faz com que muitas condenações sejam revertidas ou modificadas em instâncias superiores. A prisão imediata pode sim resultar em situações de injustiça, onde indivíduos são encarcerados indevidamente, muitas vezes por longos períodos, até que o processo seja revisado.

E se isso acontecer? E se a pessoa passar anos presa e, ao final, a decisão for pela inocência? Como recuperar estes anos de encarceramento injusto? Como o estado vai agir diante de tantas situações que podem ocorrer?

O ideal seria um equilíbrio maior entre a soberania das decisões do Júri e a necessidade de se preservar a presunção de inocência. Isso poderia ser alcançado, por exemplo, com uma revisão célere das decisões do Júri por instâncias superiores.

A preocupação é que, em nome de uma suposta celeridade e respeito à decisão popular, o sistema de justiça penal acabe atropelando garantias processuais essenciais para a manutenção de um julgamento justo e equilibrado. Afinal, a busca por um sistema penal eficiente não pode, jamais, justificar o sacrifício de direitos fundamentais que foram arduamente conquistados ao longo da história.

Enquanto a sociedade clama por respostas rápidas e efetivas, é fundamental que o Judiciário se mantenha fiel aos princípios constitucionais e evite tomar decisões que possam comprometer a justiça plena. Afinal, em um Estado Democrático de Direito, não se pode abrir mão de garantias fundamentais.

*Jorge Henrique Franco Godoy é advogado em Mato Grosso, especialista em tribunal do júri.

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