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Cuiabá, 15 de Novembro de 2024
15 de Novembro de 2024

16 de Maio de 2016, 16h:13 - A | A

JUDICIÁRIO / VENDA DE AÇÕES DA CEMAT

Justiça condena ex-secretário de Fazenda e empresário por desvio de R$ 8,8 milhões

MP os denunciou por negociar títulos da empresa estatal que estavam sendo vendidos de forma clandestina

KEKA WERNECK
DA REDAÇÃO



A juíza Selma Arruda, da Sétima Vara Criminal de Cuiabá, condenou o médico Fausto de Souza Farias, ex-secretário de Estado de Fazenda e Educação do staff do ex-governador Rogério Salles (PSDB), e o empresário José Carlos de Oliveira a 4 anos e 6 meses de prisão por desvio de dinheiro público, além de multá-los.

Eles foram denunciados pelo Ministério Público Estadual na ação que é de junho de 2008, ou seja, 8 anos depois. Fausto mora atualmente em Porto Alegre (RS) e Oliveira em Campo Grande (MS).

Eles foram denunciados pelo Ministério Público Estadual na ação que é de junho de 2008, ou seja, 8 anos depois. Fausto mora atualmente em Porto Alegre (RS) e Oliveira em Campo Grande (MS).

O inquérito policial, aberto em 2004, apurou fraude na venda de 1,5 milhão de ações da extinta Centrais Elétricas do Estado de Mato Grosso (Cemat) no valor de R$ 8,8 milhões. O empresário José Carlos de Oliveira é acusado de vender as ações junto à Bovespa, que é a bolsa de valores de São Paulo. Fausto é apontado como o responsável por tramar o esquema.

Essas ações que teriam sido negociadas irregularmente seriam “sobras” que valiam R$ 1,00 (um real) a unidade, preço estabelecido pela Auditoria Geral do Estado. 

As investigações policiais realizadas evidenciaram que Fausto de Souza Faria e José Carlos se aproveitaram dos cargos de poder que ocupavam e montaram um esquema de venda clandestina das ações, de setembro a novembro de 2002, e se apropriaram do valor das vendas.


As investigações policiais realizadas evidenciaram que Fausto de Souza Faria e José Carlos se aproveitaram dos cargos de poder que ocupavam e montaram um esquema de venda clandestina das ações, de setembro a novembro de 2002, e se apropriaram do valor das vendas.

A juíza entendeu que a denúncia do MP é “totalmente procedente”.

O crime atribuídos a ele é o de peculato, cometido por quem tem uma cargo ou posição de poder e se vale disso para "roubar" e se beneficiar de dinheiro público.

Apesar da condenação, ambos poderão cumprir em liberdade.

A decisão foi publicada nesta segunda-feira (16).

 

CONFIRA A CONDENAÇÃO NA ÍNTEGRA

 

A Representante do Ministério Público desta Comarca ofereceu, em 09/06/2008, denúncia contra: 



“PRIMEIRO DENUNCIANDO – FAUSTO DE SOUZA FARIA, brasileiro, divorciado, médico, nascido em 19/12/1945, filho de Elezário de Souza Faria e Antônia de Souza Queiros, portador do RG 100.9244-7 SJ/MT, inscrito no CPF/MF sob nº 516.357.128.15, residente e domiciliado na Avenida João XXIII, 495, apto 703, bloco C, Parque São Sebastião, Porto Alegre/RS, telefone: (51) 3392-8232, pela pratica de delito tipificado no artigo 312 do Código Penal;
SEGUNDO DENUNCIANDO – JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, brasileiro, casado, comerciante, nascido em 25/04/1962, filho de Ottília Poletto de Oliveira, portador do RG nº 10.190.270 SSP/SP, inscrito no CPF/MF sob nº 029.972.388-70, residente e domiciliado na Rua José Antônio Pereira, nº 438, em Campo Grande/MS, telefone: (67) 3321-2952, pela prática de delito tipificado no artigo 312 c/c artigo 30 do Código Penal, pelas razões que passa a expor:
1- DOS FATOS
O presente Inquérito Policial foi instaurado em 30/06/2004, pela Gerencia de Repressão a Sequestros e Investigações Especiais, para apurar fraude na venda de 1.519.787 (um milhão e quinhentos e dezenove mil, setecentos e oitenta e sete) de ações da CEMAT – CENTRAIS ELÉTRICAS DE MATO GROSSO, de propriedade do Estado de Mato Grosso, noticiada pelo ex-governador JOSÉ ROGÉRIO SALLES e pelo ex-secretário de Estado de Fazenda FAUSTO FARIA, via representação (fls. 02/07), frente ao recebimento da informação de que tais ações haviam sido negociadas na BOVESPA pelo cidadão JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA. 
Informa que o Edital nº 001/1997-CEMAT disciplinou que as ações da CEMAT de propriedade do Estado, que não fossem adquiridas pelos empregados, quer por falta de interesse ou impossibilidade em decorrência do limite de aquisição estabelecido, identificadas como SOBRAS, seriam ofertadas ao GRUPO CONTROLADOR ou a outros investidores, nas condições a serem estabelecidas pelo Conselho Diretor do Programa de Reforma do Estado
As ações acima mencionadas referiam-se exatamente ao denominado como SOBRAS e, encontravam-se registradas no Balanço Patrimonial do Estado, pelo valor unitário de R$ 1,00 (um real), vide certidão juntada as fls. 09, sendo que em 10/06/2005 foram avaliadas pela Auditoria Geral do Estado – MT, ao valor unitário médio de mercado R$ 0,47 (quarenta e sete centavos), fls. 177/186. 
As investigações policiais realizadas evidenciaram a procedência da noticia e que o valor apurado pela venda dos bens públicos foi apropriado pelos DENUNCIANDOS, conforme passa a relatar:
2- DO APURADO
Foi apurado que FAUSTO DE SOUZA FARIA e JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, durante o período de 03/09/02 a 12/11/02, o primeiro aproveitando-se do importante cargo que ocupava de SECRETÁRIO DE ESTADO DE FAZENDA DE MATO GROSSO e o segundo de sua experiência na comercialização de ações junto à bolsa de valores, uniram-se com o propósito de proceder a COMERCIALIZAÇÃO CLANDESTINA de 1.519.787 (um milhão, quinhentos e dezenove mil, setecentos e oitenta e sete) de ações escriturais das Centrais elétricas Mato-grossenses – CEMAT, pertencentes ao Estado de Mato Grosso, junto a BOVESPA e APROPRIARAM-SE DO VALOR DA VENDA.
Assim, para que as ações chegassem até a BOVESPA, a revelia dos controles públicos, foi providenciada a transferência da titularidade do erário para o SEGUNDO DENUNCIANDO – JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA.
Desta forma, na execução da trama, coube a FAUSTO FARIA, abusando da confiança que lhe era depositada, coletar a assinatura do então GOVERNADOR do ESTADO – José Rogério Salles, no documento denominado – OTA – ORDEM TRANSFERENCIA DE AÇÕES ESCRITURAIS, declarando que a operação era “não onerosa”, fazendo constar, apenas para fins regulamentares, o valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais), valor atribuído às partes no campo das características da transferência, ou seja, transferiu a titularidade sem qualquer ônus, documento que foi preenchido com a data 03/09/02, cujas assinaturas foram autenticadas pelo 6º Serviço Notarial – Registro de Imóveis da 3ª Circunscrição em 17/10/02, vide documento juntada a fl. 279.
JOSÉ CARLOS, por sua vez, apresentou o referido documento ao BRADESCO, banco no qual as ações encontravam-se custodiadas e promoveu a transferência de titularidade. Posteriormente, paulatinamente, durante o período de 03/09/02 a 12/11/02, comercializou-as na BOVESPA.
Comprovando a alienação das ações, bem como a transferência de titularidade, tem-se a relação dos acionistas da CEMAT com ações em custódia no Bradesco, na qual deixou de figurar as ações pertencentes ao Estado de Mato Grosso, confira-se:
Em 31/10/02 – 1.519.787 (um milhão, quinhentas e dezenove mil, setecentas e oitenta e sete) ações custodias, de propriedade de Mato Grosso (fl. 15);

Em 29/11/02 – 1.519.787 (um milhão, quinhentas e dezenove mil, setecentas e oitenta e sete) ações passar apontar como de propriedade do DENUNCIANDO - JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA (fl. 24); 

Em 28/02/03 – constavam apenas 520.000 (quinhentos e vinte mil) ações em nome de JOSÉ CARLOS (fls. 453/454) e 

Em 27/02/04 – já não aparece nenhuma ação da CEMAT em nome de JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, já que vendidas na Bolsa de Valores a terceiros (fls. 26). 

Em depoimento prestado perante autoridade policial, buscando afastar sua responsabilidade, FAUSTO FARIA confirma ter assinado a OTA, todavia, sustenta que foi por engano, pois acreditava que as ações da CEMAT estavam incluídas no lote das ações colocadas à venda e, ainda, que acreditava que JOSÉ CARLOS fosse o vendedor do processo licitatório para a contratação do corretor que iria comercializar as ações de propriedade do Estado. (fls. 174/176).
Ora, descabida a sustentada falta de cautela de gestor da envergadura e experiência de FAUSTO FARIA que ocupou diversos e importantes cargos de gestor na Administração Pública, ao alienar patrimônio público avaliado em mais de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais), bem como, a alegação de que, na ocasião em assinou a OTA a favor de JOSÉ CARLOS, acreditava que ele fosse o vendedor do respectivo pregão que contratou o corretor para comercializar ações do Estado, pelas seguintes razões: 
1- a OTA foi assinada em 03/09/02, cujas firmas foram reconhecidas em 17/10/02; 
2- o apontado certame – PREGÃO número 003/2002, que tinha como objetivo a contratação de empresa especializada na negociação de ativos públicos em bolsa de valores e/ou balcão através de leilão público referente a ações de telefone e outras empresas pertencentes ao Estado de Mato Grosso foi realizado em 30/10/02, cujo resultado foi homologado pelo próprio FAUTO FARIA, na mesma data, ou seja, quase dois meses após ter assinado a OTA, conforme registra os documentos juntados as fl. 52/53
3- a vencedora de pregão e contratada para promover as vendas das ações de telefonia foi à empresa AROUCH INVEST EMPREENDIMENTOS E SERVIÇOS S/C LTDA. Então se pergunta:
COMO ERA POSSIVEL TER OCORRIDO A NOTICIADA CONFUSÃO? 
Ou seja: ter assinado a OTA acreditando que o vencedor era JOSÉ CARLOS e que as ações da CEMAT estavam no lote, se tais resultados ainda não existiam!
Ainda, considerando a singela justificativa apresentada por FAUSTO FARIA, então secretário de fazenda, indaga-se:
Se ele assinou a OTA acreditando que a comercialização havia sido autorizada e era regular, então como justifica que ele, na condição de Secretário de Fazenda:
1- NÃO COBROU O RESULTADO DAS VENDAS?
2- QUE TAIS RESULTADOS NÃO TENHAM SIDO CONTABILIZADOS? e 
3- QUE A ALIENAÇÃO DAS AÇÕES DA CEMAT NÃO TENHAM SIDO REGISTRADAS NO BALANÇO PATRIMONIAL DO ESTADO? 
Pois é importante não esquecer que a venda das 1.519.787 ações da CEMAT passou ao largo dos registros contábeis e financeiros do Estado. 
Registra que JOSÉ CARLOS, quando inquirido pela autoridade policial, ao lhe ser apresentado a OTA apontando-lhe como beneficiário da transferência, CONTRADIZENDO o seu COMPARSA, RECONHECE a TRANSFERENCIA, afirmando ter realizado o negócio por imposição de FAUSTO FARAIA, quando, na condição de corretor, advertiu que não havia mercado para estas ações, informando-lhe que a única forma de vendê-las era por intermédio de venda direta, fl. 38/40.
Na oportunidade apresentou a estupenda revelação, que pagou pelas ações a importância de 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), valor integralmente pago a servidor da SEFAZ/MT, cuja identidade recusou-se em apontar, vide fls. 150/151, alegando que não apontaria o nome do servidor por temer por sua própria vida e de seus familiares.
A versão fantástica para o pagamento da importância de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) em espécie, a pessoa, no interior da SEFAZ/MT, sem que fosse apresentado documento comprobatório e, igualmente, inverossímil, mormente, pela recusa em fornecer o nome do servidor que recebeu a apontada importância. 
Ora, JOSÉ CARLOS não titubeou em afirmar que realizou negócio com o então Secretário de Fazenda, que formulou o pagamento de forma clandestina. Afirmações graves as quais menciona sem qualquer receio, todavia, teme indicar o nome de subalterno que recebeu a importância de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), afirmando não faze-lo, por temer pela sua vida e de seus familiares. 
Francamente é um absurdo. Evidente que não aponta tal nome, porque não há nenhum nome a indicar, posto que, os fatos não ocorreram como narrados, já que tudo foi mancomunado com o seu comparsa FAUSTO FARIAS. 
Dando continuidade às informações inverídicas JOSÉ CARLOS no referido depoimento, sustentou, ainda, que toda a operação foi acompanhada pelo funcionário SANDRO EREGIPE COELHO. 
A oitiva de SANDRO EREGIPE revela a astúcia de JOSÉ CARLOS que pretendia confundir a autoridade policial que apurava os fatos, pois o funcionário confirmou que acompanhou JOSÉ CARLOS na venda de ações, todavia, para a venda das ações das companhias telefônicas, cuja transação foi regular e na qual JOSÉ CARLOS atuava como proposto da empresa Arouch Invest Empreendimentos e Serviços S/C Ltda., vencedora do pregão de número 003/2002 na condição de corretora de valores, fl. 158/159 e 169/170. 
Em sua declaração SANDRO EREGIPE afirmou textualmente que as ações da CEMAT não estavam incluídas no lote que foi transferido no BRADESCO S/A., naquela ocasião e, ainda, que tais ações não estavam abrangidas pela Lei 7.801 de 04/02/02 que autorizava somente a venda das ações de telefonia (fls. 158).
Imperioso registrar que José Rogério Salles, Governador na época dos fatos, afirma que desconhece a operação em questão e não se recorda de ter assinado a OTA da CEMAT, acreditando que a assinatura aposta no referido documento é falsificada, fls. 163/165. 
As declarações do então governador ilustram que foi usado pelos DENUNCIANDOS que, ardilosamente, levaram-no a erro, camuflando a Ordem de Transferência das Ações – OTA entre os documentos que efetivamente deveria assinar. 
Esclarece que a Secretaria de Estado de Fazenda, por intermédio do ofício nº 1790/GPG/ 2002, de 12/11/02, formulou consulta a Procuradoria Geral do Estado de Mato Grosso, solicitando orientação de como proceder à venda de ações, quando foi informado que no caso de venda em bolsa de valores a licitação poderia ser dispensada, desde que precedida de avaliação e rigoroso cumprimento à legislação pertinente (fls. 63), ressaltando que esta consulta foi realizada após a assinatura do OTA e após a realização do apontado pregão.
Destaca, ainda, que a referida transação só foi descoberta pela Auditoria Geral do Estado de Mato Grosso que ao realizar seus trabalhos de rotina constatou a existência de contradição nas informações contidas no Balanço Patrimonial do Estado e aquelas fornecidas pelo Banco Bradesco, que não apontavam ações da CEMAT de propriedade de Mato Grosso naquela instituição custodiadas, registrando que somente após tal constatação foi formulada a representação que provocou a instauração desta investigação.
Informa que a legislação que disciplina as regras sobre licitações – Lei 8.666/93, não exige autorização legislativa para a venda de ações, autorizando a dispensa de processo licitatório, desde que a negociação ocorra em bolsa de valores, todavia, impreterivelmente, precedida de avaliação. 
“Art. 17 – A alienação de bens da Administração Pública, subordinada à existência de interesse público devidamente justificado, será precedida de avaliação e obedecerá às seguintes normas: 

II – quando móveis dependerá de avaliação prévia e de licitação, dispensa esta nos seguintes casos:

c) venda de ações que poderão ser negociadas em bolsa, observada a legislação específica;” 
No presente caso, considerando que a transferência originária de titularidade foi para JOSÉ CARLOS, constata-se que não estava presente a condição que autorizava a DISPENSA de LICITAÇÃO, portanto, consumando conduta identificada como FRAUDE A LICITAÇÃO.
Não obstante a ALIENAÇÃO INFORMAL e ao ARREPIO DA LEGISLAÇÃO VIGENTE de PATRIMÔNIO PÚBLICO, foi apurado que a apontada conduta foi meio para que os DENUNCIADOS pudessem DESVIAR e se APROPRIAR DO PRODUTO ARRECADADO NA RESPECTIVA VENDA, pois conforme esclarecido, na contabilidade do Estado de Mato Grosso as ações até 27/06/05 continuavam figurando no Registro Patrimonial, como se nunca tivesse sido alienadas (vide documentos juntados às fls. 11 e 211). 
Assim, considerando o valor registrado no balanço patrimonial das ações em questão, evidencia-se que os DENUNCIANDOS DESVIARAM e APROPRIARAM de receita pública, qual seja: a receita das vendas das apontadas ações, no valor de R$ 1.519.787,00 (um milhão, quinhentos e dezenove mil, setecentos e oitenta e sete reais), que atualizado atinge a quantia de R$ 2.403.782,05 (dois milhões, quatrocentos e três mil, setecentos e oitenta e dois reais e cinco centavos).
Informa por fim, que os DENUNCIADOS, pela conduta ora descrita, respondem a Ação Civil Pública nº 628/2007, em trâmite na 4ª Vara Especializada da Fazenda Pública desta Capital. 
Informa, ainda, que o DENUNCIANDO FAUSTO FARIA responde também a Ação Penal nº 125/2008 em trâmite na 15ª Vara Criminal da capital, pela prática de Assunção de Obrigação no Ultimo Ano do Mandato ou Legislatura, bem como, responde a Ação Penal nº 51/1996 em trâmite na 2ª Vara Criminal de Rondonópolis pela prática de Peculato. 
Portanto, ficou demonstrado, com a conduta apontada, que os DENUNCIANDOS FAUSTO DE SOUZA FARIA e JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA praticaram PECULATO, desviando e apropriando receita pública. 
Encerrou a peça acusatória requerendo o seu recebimento, assim como a determinação da citação dos denunciados para responderem à acusação, as oitivas das testemunhas arroladas e, por fim, a condenação na sanção do dispositivo constante na inicial.
A denúncia veio acompanhada do rol de testemunhas e do Inquérito Policial nº 019/04 (fls. 02/467 vol. 03). 
Decisão proferida em 20/06/2008 recebeu a denúncia oferecida pelo Ministério Público e determinou a citação dos acusados para apresentarem resposta à acusação (fls. 469). 
Despacho proferido em 08/06/2008 determinou a expedição de cartas precatórias para citação dos réus (fls. 473). 
O acusado FAUSTO DE SOUZA FARIA foi citado (fls. 626-verso) e em 06/10/2008 protocolou resposta à acusação e juntou documentos (fls. 488/623). 
A defesa do denunciado JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA protocolou em 29/09/2008 documento procuratório e defesa preliminar (fls. 633/645). 
Decisão proferida em 19/11/2008 manteve o recebimento da denúncia e designou audiência de instrução e julgamento (fls. 646/647). 
A audiência de instrução e julgamento designada para o dia 31/03/2009 não foi realizada, em razão da ausência do acusado Fausto de Souza Farias por motivos de saúde, sendo redesignada para o dia 21/05/2009 (fls. 673). 
Em 21/05/2009 foi realizada a audiência de instrução e julgamento, ocasião em que foram inquiridas as testemunhas SANDRO COELHO EREGIPE, CESAR RUBENS GONÇALVES, JOSÉ EDUARDO LEITE, LUCIENE APARECIDA DE MAGALHÃES e LUCIANO INÁCIO DA SILVA. 
Foi designada para o dia 23/06/2009 a continuação da audiência para o interrogatório do acusado JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA e inquirição da testemunha CRISTIANE NIGRO PIMENTA. Na oportunidade, determinou o interrogatório do réu FAUSTO DE SOUZA FARIA por carta precatória (fls. 692/693).
A defesa do acusado FAUSTO DE SOUZA FARIA protocolou em 10/07/2009 petição pugnando pelo adiamento da audiência do interrogatório do acusado para data posterior a 20/08/2009 (fls. 712/718). 



Decisão proferida em 28/07/2009 não acolheu o requerimento da defesa de FAUSTO DE SOUZA, com fulcro 222, § 1º do CPP (fls. 724). 



Audiência de instrução e julgamento realizada em 20/08/2009, ocasião em que foi inquirida a testemunha CRISTINE NIGRO PIMENTA, ausente o acusado JOSÉ CARLOS por motivos de saúde. Foi designada a audiência de interrogatório do réu para o dia 24/11/2009 (fls. 734). 



Audiência de interrogatório do réu JOSÉ CARLOS OLIVEIRA realizada em 24/11/2009 (fls. 754). 



Termo de degravação do interrogatório do réu FAUSTO SOUZA FARIA, realizado por carta precatória na comarca de Porto Alegre/RS (fls. 788/790). 
Em 26/03/2010 o Ministério Público protocolou alegações finais, pugnando pela condenação dos acusados pelo crime descrito no artigo 312, do Código Penal, com aplicação da pena acima do mínimo legal (fls. 791/807). 
A defesa de JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA protocolou em 14/06/2010 memorias, requerendo o reconhecimento do peculato culposo ou peculato por erro de outrem (fls. 819/854). 
Em 09/07/2010 a defesa contratada por FAUSTO DE SOUZA FARIA protocolou memoriais, requerendo a absolvição do acusado (fls. 856/883). 
Decisão proferida em 25/06/2013 determinou vista dos autos ao Ministério Público para manifestar acerca da possibilidade de reconhecimento da prescrição retroativa antecipada (fls. 909).
O Representante Ministerial protocolou em 03/07/2013 manifestação, requerendo a prolação da sentença (fls. 910/913). 
Após, vieram os autos conclusos.

É O RELATÓRIO.
FUNDAMENTO E DECIDO.

Pretende-se através da presente ação penal atribuir a FAUSTO DE SOUZA FARIA e JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, já qualificados nos autos, a prática do crime de peculato, o qual se encontra tipificado no artigo 312, caput, do Código Penal, c/c artigo 30, caput, do referido Codex em relação ao acusado JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA. 
Os réus foram denunciados por terem efetuado a venda indevida de 1.519.787 (um milhão, quinhentos e dezenove mil setecentos e oitenta e sete) ações escriturais da CEMAT – Centrais Elétricas de Mato Grosso, de propriedade do Estado de Mato Grosso, no período de 03/09/2002 a 12/11/2002, ações estas que foram identificadas como sobras e foram negociadas na Bovespa – Bolsa de Valores do Estado de São Paulo, pelo réu JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA. 
Em um segundo momento o acusado FAUSTO DE SOUZA FARIA, que ocupava o cargo de Secretário de Estado de Fazenda de Mato Grosso, abusando da confiança que lhe era depositada coletou assinatura do então Governador, na época, José Rogério Salles, no OTA – Ordem de Transferência de Ações Escriturais, ao qual também assinou na condição de secretário e, assim, autorizaram a transferência dessas ações ao seu aliado JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, documento este imprescindível para que fossem realizadas as vendas junto a Bovespa. 
Após a coleta de assinaturas, o réu JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA apresentou o documento ao Banco Bradesco, responsável pela custódia das ações e, desta forma, os títulos foram transferidos ao réu JOSÉ CARLOS e, posteriormente, comercializadas na bolsa de valores, cujo dinheiro foi apropriado 
A denúncia é totalmente procedente. 
Inicialmente, vejo que a materialidade da conduta criminosa se encontra comprovada por meio do interrogatório do réu JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA (fls. 47/49 e 754/755), cópias de procurações outorgadas pelo Estado de Mato Grosso ao réu JOSÉ CARLOS e a Empresa Arouch Invest Empreendimentos e Serviços S/C Ltda (fls. 50/52), cópia da ata de homologação do pregão 003 (fls. 61/62), juntada da OTA transferindo as ações ao réu JOSÉ CARLOS (fl. 289), declarações do funcionário do cartório do 6º ofício da capital, José Pires (fls. 131/132 e 293/294), e, por fim, pelos documentos das ações em custódia do Banco Bradesco (fls. 23/24,32/33 e 34/35).
Quanto à autoria, as provas produzidas nos autos, ainda na fase inquisitorial e depois reproduzidas em Juízo, indicam serem os acusados os autores do crime em questão.
A versão apresentada pelo réu FAUSTO DE SOUZA FARIA sobre esse fato criminoso não possui amparo nas provas produzidas nos autos, de modo que resulta isolada. 
uando ouvido em juízo, negou ter praticado o crime de peculato, vejamos : 
(...) Quando soube através de boato do fato relatado, eu e o ex-governador, espontaneamente, procuramos a polícia e solicitamos que se procedesse à investigação sobre o que se comentava. Fui Secretário de Fazenda de abril de 2002 até 31/12/2002. O Estado decidiu vender as ações que dispunha por necessidade de caixa para cumprir compromissos financeiros porque era final de mandado, além de responsabilidade fiscal com exigências maiores do que no passado, e o que tinha disponível ou mais facilmente negociável eram ações, decidido isso na Secretaria de Estado, discutido com o Governador, a Secretaria tomou todas as medidas que cabem a administração pública. Quanto à transferência das ações para Jose Carlos Oliveira nós procedemos como devia proceder. Foi feita uma licitação, contratado uma corretora, até porque o Estado não tem competência para isso e nem servidores com essa experiência, e assim foi feito. Assinava em algumas oportunidades, mais de três certamente, montanhas de papéis, a esse fim (transferência de titulares das ações) (...). Chegavam os documentos na presença dessas três pessoas: Sandro, funcionário da Secretaria, com procuração para acompanhar todo o processo, uma mulher do cartório e o senhor Zé Carlos que era o representante preposto da empresa que ganhou a licitação para promover as vendas. Assinava todos e devolvia, esses documentos eram encaminhados, depois, ao gabinete do Governador para também fazer a assinatura, eram montanhas de papel e como vinha acompanhado do servidor da Secretaria encarregado de acompanhar o processo, a mim parecia absolutamente correto os documentos. Se fosse examinar um por um e os documentos que assinavam, certamente passaria mais de um dia em cada uma daquelas seções em que eu fiz a assinatura e foram várias seções. Certamente mais de três vezes essas três pessoas, compareceram lá solicitando a assinatura. Não conhecia Jose Carlos Oliveira antes, procurou a Secretaria se apresentando como um experiente homem do mercado de ações. Inicialmente a Secretaria lhe deu uma procuração exclusiva para fazer o levantamento do que o Estado tinha, e como podia ser comercializado e vendido. Fez esse trabalho e diante desse levantamento procedeu-se à licitação e foi contratada a empresa. Neste processo, soube que quem fez o levantamento acabou sendo o representante da empresa que ganhou a licitação e deu andamento no processo. Havia um acompanhamento da negociação desses títulos. O representante da Secretaria com cooperação, posteriormente, nesse mesmo processo foi várias vezes a São Paulo acompanhar o processo. Não acompanhou se esses títulos foram negociados na Bolsa de Valores, até porque entendia que a Secretaria estava com funcionário de carreira com a procuração para tal, indicado pela superintendência responsável. Depois de iniciado processo, licitação pronta, assinei essa montanha de papéis, de vez em quando tomava conhecimento das informações. Quando tomamos conhecimento que não houve registro no balanço patrimonial do estado em relação à alienação dessas ações, é que nós, o ex-governador Rogério e eu, solicitamos à polícia que investigasse, até então nós não tínhamos conhecimento disso. A contabilidade do Estado é que tinha a responsabilidade de fazer esses lançamentos e acompanhar e fiscalizar a alienação das ações, e a superintendência que acompanhava todos os órgãos privatizados, extintos e em extinção que ocorreu no Estado desde que foi feita a sua reforma. Os valores das ações entraram na boca do tesouro do Estado. Conhecia Sandro Coelho Eregipe. Era o funcionário da Secretaria de Fazenda que por indicação da superintendência encarregado dos órgãos de extinção, recebeu procuração para acompanhar, agilizar, juntar documentos, atender o que a licitação determinou. Não acompanhou o pregão para contratar o corretor, comercializar essas ações. Todos os documentos que assinou liberando ações para venda foram posteriores ao contrato assinado com a corretora. (fls. 788/790).

Entretanto, no decorrer da instrução, diante dos elementos probatórios colhidos, não restaram dúvidas acerca da autoria imputado aos réus no evento criminoso, posto que os depoimentos das testemunhas foram corroborados pelas declarações do acusado JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA. 
Convém mencionar que o próprio réu JOSÉ CARLOS, tanto na fase inquisitorial como em juízo, descreveu como realizou a venda e a compra das ações da CEMAT de Mato Grosso, e como o denunciado FAUSTO DE SOUZA FARIA, Secretário de Fazenda na época, participou do procedimento para a comercialização. 
Quando interrogado pela Autoridade Policial, o acusado JOSÉ CARLOS informou que: “(...) Logo depois de realizado a licitação, bem como conferido procuração para a empresa AROUCHE autorizando representar o Estado na venda das ações, o declarante foi incisivo e disse ao Secretário de Fazenda que todas as ações poderiam ser vendidas com certa facilidade, exceção feita apenas as ações da CEMAT S/A, pois não havia negócio no mercado, a não ser por uma transferência ou venda direta para um terceiro investidor, e mesmo assim seria difícil vende-la. Em razão dessa alegação, o Dr. Fausto respondeu-lhe que não ficasse somente com o “filé mignon” , pois deveria ficar com os “ossos duros”, fazendo referência então as ações da CEMAT. O declarante então argumentou para que fosse realizado a operação direta seria necessário o ESTADO conferir-lhe poderes através de procuração pública e uma ordem de transferência direta, no que o Secretário respondeu que isso não seria problema. (...) a ORDEM DE TRANSFERÊNCIA DE AÇÕES ESCRITURAIS alusivas as ações da CEMAT S/A foi feita em seu nome única e exclusivamente pelo fato da inviabilidade de comércio no próprio nome da CEMAT, salientando que o Dr. FAUSTO FARIA concordou, e de tudo estava a par (...). ”(fls. 48/49). 

Em juízo, ratificou seu depoimento, afirmando em síntese que (...) trabalhava na área de capitais. Conseguiu ter um acesso dentro do Governo para poder fazer o trabalho de venda e recuperação dos ativos do Governo; Foi recebido pelo Secretário de Fazenda que concordou em fazer o bloqueio das ações pra recuperar o valor para o Estado. Foi pré-contratado para fazer os levantamentos de todos os ativos, por meio de procuração. Fez a venda de forma limpa, e o Estado recebeu o dinheiro através de Doc. ou Ted. No meio da negociação surgiram às ações da Cemat, constatou que essas ações seriam de difícil venda, foi até o Secretário e ele disse para realizar a venda de todas as ações. Disse a ele que a única forma de vender as ações da Cemat seria por um investidor interessado para especular. Não encontrou nenhum investidor interessado, então foi novamente até Fausto, e disse que a tentativa de fazer a venda das ações seria pra um investidor particular. Foi até São Paulo e não conseguiu o investidor. Chegou à conclusão de que não iria contrariar o Estado, já que foi feita em seu favor a abertura das prefeituras pelo prefeito Milton Leitão. Decidiu comprar as ações, tinha uma quantia do valor que conseguiu com a venda de outras ações, e conseguiu completar o valor com um empréstimo. Preparou o termo de transferência. Disse a Fausto que só ia fazer a liquidação das ações após o bloqueio. Em quinze dias as ações foram transferidas para seu nome. Ligou para Secretaria e perguntou de que forma deveria fazer o depósito do dinheiro. Foi informado que deveria levar o dinheiro em espécie. Chegou a Cuiabá com o dinheiro e ligou novamente na SEFAZ, falou com uma mulher que disse que podia levar o dinheiro até lá porque alguém estaria esperando na portaria, então fez dessa forma. Na entrada da SEFAZ tinha um senhor fardado esperando, entregou o dinheiro a esse senhor e ligou novamente para a mulher, a qual lhe disse que estava tudo certo. Houve a licitação, a empresa Arouch venceu. Não pediu recibo porque não queria contrariar o Governo. A mulher que passou a informação de que podia levar o dinheiro até a Secretaria era uma assessora ou secretária, não recorda o nome dela. Vendeu as ações na bolsa de valores por um valor bem inferior do que foi comprado. A privatização da Cemat ocorreu após essa operação. Declarou no Imposto de Renda o valor pago pelas ações. Quando fez a entrega do dinheiro estava acompanhado por um parceiro de trabalho. Pagou pelas ações em uma vez. A mesma pessoa com quem tratou da entrega do dinheiro, posteriormente reclamou a falta de 3.000,00 (três mil reais), porém não fez a entrega desse valor. Sua família não sofreu ameaças, disse isso quando foi ouvido na Delegacia porque estava sendo pressionado. Pediu o termo de transferência antes de realizar o pagamento. Disse que nunca tinha visto o senhor pra quem entregou o dinheiro. Foi um coronel que passou o contato com a Secretaria. Tinha costume de fazer operações com órgãos públicos. O valor de mercado referente às ações não era alto. Disse que conhecia Fausto somente da SEFAZ, tinham relacionamento profissional . (CD/DVD fls. 755).

A testemunha SANDRO COELHO EREGIPE, declarou em juízo que (...) na época trabalhou com vendas das ações da TELEMAT. Trabalhou no setor público, acompanhava a venda das ações de telefone. Não constavam ações da CEMAT, manuseava apenas as documentações dos representantes das empresas. A empresa Arouch que era a representante do Estado na bolsa de valores. Em janeiro de 2003 foi chamado pelo Secretário Auditor para prestar informações sobre as ações da Cemat, porém só trabalhava com ações de telefones. Fausto que apresentou José Carlos. Coletava documentos necessários para efetuar a venda das ações de telefone. Quando era efetuada a venda de ações logo já entrava a quantia na contabilidade e retirava do patrimônio do Estado essas ações. Não tem conhecimento da venda de ações da Cemat. Não esteve em São Paulo com José Carlos acompanhando venda de ações. Não se recorda da empresa de José Carlos. Não sabe se ele foi contratado pela SEFAZ após as vendas das ações. Precisava da assinatura do Governador para fazer as vendas das ações telefônicas. Eram juntados todos os documentos, José Carlos preenchia as documentações requisitadas pelo Banco e encaminhava ao Fausto que assinava e depois levava até o gabinete do Governador. Fazia a checagem dos documentos que iria entregar para o Governador. Não tratou em momento nenhum das ações da Cemat. Todas as negociações exigidas pelo banco precisavam da autenticidade no cartório . (CD/DVD fls. 695).

LUCIANO INÁCIO DA SILVA relatou que (...) instaurou inquérito requisitado pelo Ex-Governador Rogério Sales para apurar ações que teriam sido transferidas de forma irregular para o nome de José Carlos. Detectaram a saídas das ações através de uma auditoria, ocorreu uma simulação de venda. José Carlos disse que pagou 150.000,00 (cento e cinquenta mil) em duas vezes por essas ações, ele se recusou a dizer o nome do servidor que recebeu por essas ações. Disse que Sandro acompanhou a venda de ações, foi até a matriz do Banco Bradesco, na época do inquérito ele também disse desconhecer a venda de ações da Cemat. As ações foram transferidas com as assinaturas do ex governador e do ex secretário de Fazenda Fausto. José Carlos teve ajuda de alguém de dentro do governo para a venda dessas ações, acha que foi por algum auxiliar do governo e que induziu a erro o governador e o secretário da fazenda. José Carlos comprou de forma simulada as ações e não houve registro de entrada do pagamento. Quando o ex governador foi ouvido na delegacia não se lembrava de ter autorizado a venda das ações da Cemat. Na época José Carlos não levou a seu conhecimento nenhum tipo de ameaça. Pagou pelas ações a um funcionário, não disse o nome desse funcionário, pois estava com medo. Não há registros que tenha entrado qualquer valor na contabilidade do Estado como forma de pagamento por essas ações . (CD/DVD fls. 695).

O depoimento das demais testemunhas, não deve ser levado em consideração, tendo em vista que restou evidente que eles não sabiam informar acerca dos fatos.

Vê-se, assim, que a autoria do crime em questão se encontra confirmada nos autos, restando demonstrado que a versão apresentada pelo réu FAUSTO DE SOUZA FARIA em juízo foi apenas uma tentativa de se eximir do crime de peculato cometido por ele, juntamente com o acusado JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA, estando essa versão totalmente dissociada do conjunto probatório dos autos. 

Desta forma, verifica-se que as alegações apresentadas pela defesa de que não há nos autos provas suficientes para ensejar a condenação dos réus e que não foram eles os autores do delito em questão, não merecem acolhimento.
Diante dos fatos aqui narrados, restou evidente que a licitação para a venda das ações de propriedade do Estado de Mato Grosso só ocorreu no dia 30/10/2002 e que o acusado FAUSTO FARIA, abusando da confiança que lhe era depositada, no dia 03/09/2002 coletou a assinatura do governador do Estado no OTA-Ordem de Transferência de Ações Escriturais e, após, assinou o documento na condição de Secretário, autorizando a transferências das ações ao denunciado JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA. 
Assim sendo, antes mesmo de ocorrer o processo licitatório para a contratação da empresa responsável pela comercialização das ações da CEMAT, elas já haviam sido transferidas ao denunciado JOSÉ CARLOS, por força do acordo já firmado com o réu FAUSTO DE SOUZA FARIA.

Posteriormente, estando na posse da OTA devidamente assinada e com firma reconhecida, o acusado JOSÉ CARLOS compareceu ao Banco Bradesco, onde as ações da CEMAT estavam custodiadas e promoveu a transferências da titularidade e, na condição de proprietário, pode livremente aliená-las na BOVESPA-Bolsa de Valores de São Paulo, e assim o fez, conforme ele mesmo confirmou em seu interrogatório realizado em juízo, mencionado alhures. 

Consta nos autos que JOSÉ CARLOS, posteriormente, adquiriu as ações da CEMAT pelo valor de R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais), afirmando que pagou tal importância ao Estado (em espécie e pessoalmente a um funcionário do Estado) no estacionamento da Secretaria de Fazenda.
Diante desta conduta, fica demostrada a má-fé do denunciado, posto que nenhuma venda de patrimônio público se procede da forma como descreveu, na clandestinidade. 

No mais, restou comprovado que JOSÉ CARLOS vendeu as ações na bolsa de valores, mas o dinheiro não foi repassado para o Estado. 
Para demostrar que as vendas foram ocultadas da contabilidade, aponta Cópia do Balancete Mensal do Tesouro Estadual da data de 31/12/2003 (fls. 21/22) que as ações da CEMAT constavam como pertencentes ao Estado, data posterior a venda na bolsa de valores.

Deste modo, para o Estado, essas ações não foram vendidas a JOSÉ CARLOS e muito menos disponibilizadas na bolsa de valores. 
Pelo exposto, nota-se que se JOSÉ CARLOS não tivesse auxílio do denunciado FAUSTO DE SOUZA FARIA, certamente não obteria a transferências das ações, visto que não tinha nenhum acesso ao Governador, para poder coletar sua assinatura e, assim, não conseguiria vende-las e ocasionar tamanho desfalque nos cofres públicos. 

Diante dos fatos narrados, restou claramente demonstrado a ocorrência do crime de peculato, uma vez que presentes os elementos objetivos e subjetivos do tipo penal do art. 312, caput, do Código Penal, eis que os acusados efetuaram a venda indevida de 1.519.787 (um milhão, quinhentos e dezenove mil setecentos e oitenta e sete) ações escriturais da CEMAT – Centrais Elétricas de Mato Grosso, de propriedade do Estado de Mato Grosso, valendo-se da facilidade dos cargos que exerciam. 

Ademais, para evitar futura alegação de que a presente sentença foi omissa, verifico que não merece ser acolhida a tese suscitada pelas defesas de que os fatos trazidos ao processo tratar-se-iam de peculato culposo.
Isso porque, no crime descrito no artigo 312, caput, do Código Penal, o dolo evidencia-se quando há a intenção de desviar os valores para si ou para outrem, em razão do cargo de funcionário público. 
No caso em tela, resta-se indevida a desclassificação para a modalidade culposa do crime de peculato por restar comprovado que os réus tinham a intenção de desviar as ações pertencentes ao Estado em proveito próprio e, assim agindo, praticaram a conduta proibitiva descrita no caput do artigo 312 do Código Penal.
Neste sentido, colaciono a seguinte jurisprudência:

“EMENTA: APELAÇÃO CRIME. CRIME DE PECULATO (ART. 312, DO CP). ARGUMENTO DE FORMA DE INÉPCIA DA DENÚNCIA, POR NÃO DESCREVER A CONDUTA ISOLADA DE CADA ACUSADO. INOCORRÊNCIA. INICIAL ACUSATÓRIA QUE ATENDE AOS REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP. ALEGADA NULIDADE DA SENTENÇA POR NÃO ENFRENTAR TODAS AS TESES DA DEFESA. DESCABIMENTO. FUNDAMENTOS E MOTIVAÇÃO DA DECISÃO BEM DEMONSTRADOS. PLEITO DE DESCLASSIFICAÇÃO PARA A MODALIDADE DE PECULATO CULPOSO. ROGATIVA DE UM DOS RÉUS PELA DESCLASSIFICAÇÃO PARA ESTELIONATO QUALIFICADO COM FRAUDE NO PAGAMENTO. INACOLHIMENTO. EVIDENCIADO O DOLO DE DESVIAR OS VALORES EM BENEFÍCIO PRÓPRIO OU DE OUTREM. CONFIGURAÇÃO DA MODALIDADE DOLOSA DE PECULATO, POIS OS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS LOTADOS NO GRUPO FINANCEIRO SETORIAL (GFS) RECEBIAM OS VALORES DAS BOLSAS DO PROGRAMA "UNIVERSIDADE SEM FRONTEIRAS" DA SECRETARIA DE ESTADO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA E ENSINO SUPERIOR (SETI).PEDIDO DE APLICAÇÃO DE CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE.DEVOLUÇÃO DE PARTE DOS VALORES. PARA CARACTERIZAÇÃO DO ARREPENDIMENTO POSTERIOR, HÁ DE SE REALIZAR A REPARAÇÃO INTEGRAL DA QUANTIA DESVIADA.PRECEDENTES DO C. STJ. RECURSOS DESPROVIDOS. 1. Não há que se falar em inépcia da inicial quando a denúncia está em perfeita consonância com os requisitos insertos no art. 41 do CPP, pois descreve os fatos e suas circunstâncias, com clareza e individualiza a conduta dos réus. 2. Se os fundamentos utilizados pelo julgador estão bem delimitados e demonstrada a motivação da decisão, não há que se falar em nulidade por ausência de apreciação de todas as teses suscitadas pelas partes (Nesse sentido é a Jurisprudência do C.STJ: "(...) 3. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que não há nulidade no decisum que não analisa especificamente todas as teses aduzidas pelas partes, no caso de os fundamentos utilizados se revelarem suficientes para o deslinde da controvérsia.". (HC 182.572/PR, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 03/06/2014, DJe 20/06/2014). 3. Evidenciado o dolo de desviar os valores para si ou para outrem, em razão do cargo de funcionário público, impossível a desclassificação para a modalidade culposa de peculato, ou para estelionato mediante fraude no pagamento. 4. Somente se aplica a causa de diminuição da pena inserta no art. 16 do CP nas hipóteses de reparação integral do dano, que, no caso, seria a devolução integral dos valores desviados. I. (TJPR - 2ª C. Criminal - AC - 1234022-6 - Curitiba - Rel.: José Mauricio Pinto de Almeida - Unânime - - J. 26.02.2015). (TJ-PR - APL: 12340226 PR 1234022-6 (Acórdão), Relator: José Mauricio Pinto de Almeida, Data de Julgamento: 26/02/2015, 2ª Câmara Criminal, Data de Publicação: DJ: 1526 16/03/2015).

Do mesmo modo, entendo que não é cabível a aplicação do crime de peculato por erro de outrem pugnado pela defesa do acusado JOSÉ CARLOS.
Segundo o doutrinador Guilherme de Souza Nucci, “erro é a falsa percepção da realidade. Torna-se necessário que a vítima, por equivocar-se quanto à pessoa do funcionário público encarregado de receber o dinheiro ou a utilidade, termine entregando o valor a quem não está autorizado a receber. Este por sua vez, interessado em se apropriar do bem, nada comunica à pessoa prejudicada, nem tão pouco à Administração (...)”. 

No caso em questão, o denunciado JOSÉ CARLOS tinha pleno conhecimento da realidade, inclusive foi ele quem procurou o réu FAUSTO FARIA para informar-se a respeito das ações pertencentes ao Estado de Mato Grosso, sempre ficando a par de todos os procedimentos, tanto que foi o responsável pela venda das mesmas na bolsa de valores. 

Portanto, em face do conjunto probatório vertido para os autos, em especial pelos documentos constantes no inquérito policial e pelo teor dos depoimentos prestados em juízo, sob o crivo do contraditório, tenho que os acusados JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA e FAUSTO DE SOUZA FARIA praticaram o crime de peculato.

Noutro giro, consigno que, embora o crime em questão seja considerado crime funcional próprio, nada impede que o funcionário atue em concurso com particular, devendo todos responder pela infração penal. Logo, não há óbice em imputar a prática do art. 312 do CP, ao acusado que não seja servidor público, desde que tenha atuado em concurso com agente da administração.
A qualidade de funcionário público, sendo elementar do tipo penal em questão, comunica-se a todos os autores e partícipes do delito por força do disposto na parte final do art. 29 e 30, ambos do Código Penal.
Assim sendo, JULGO PROCEDENTE a pretensão punitiva do Estado em relação aos réus JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA e FAUSTO DE SOUZA FARIA, qualificados nos autos as fls. 02, CONDENANDO-OS como incurso nas sanções do dispositivo supra registrado.
Não vislumbro nos autos quaisquer excludentes de ilicitude que poderiam justificar o comportamento dos acusados. 

Excluem a culpabilidade a inimputabilidade, a potencial consciência da licitude do ato e a inexigibilidade de conduta diversa. 

Não encontro presentes, no entanto, as dirimentes previstas nos arts. 26, 20 parágrafo 1º, e arts. 21 e 22 do CP, que pudessem socorrê-los e tenho que devam ser apenados.

Passo a dosar-lhes as penas, portanto:

) Em relação a JOSÉ CARLOS DE OLIVEIRA:

Impõe-se a análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP: culpabilidade evidenciada, tendo o réu agido com dolo direto. É primário e não possui antecedentes criminais. Conduta social não pode ser aferida para fins de aumentar a pena, eis que dentro dos padrões normais (família, endereço fixo, emprego lícito). A personalidade do réu não pode ser avaliada pela ausência de elementos indicadores nos autos, eis que afeta à índole, senso moral e emocional de cada indivíduo. O motivo para o cometimento do crime foi por ganância, o que não justifica a prática do ato. As consequências extra-penais foram graves em razão da quantia desviada dos cofres públicos e o prejuízo social causado. 
Em face disto, verificando que as circunstâncias lhe são desfavoráveis, fixo-lhe a pena-base em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 50 (cinquenta) dias-multa, fixando cada dia multa em 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato. Torno-a, assim, definitiva em, à falta de outra modificadora. 

b) Em relação a FAUSTO DE SOUZA FARIA:

Impõe-se a análise das circunstâncias judiciais do artigo 59 do CP: O réu agiu com dolo direto, possuindo potencial consciência da ilicitude e de que lhe era exigível conduta diversa. Seu comportamento foi extremamente reprovável por conta da condição de servidor público, contrariando a ética profissional visto que utilizou do seu cargo para facilitar a prática do crime. O réu é primário e não possui antecedentes criminais. Conduta social não pode ser aferida para fins de aumentar a pena, eis que dentro dos padrões normais (família, endereço fixo, trabalho lícito). A personalidade do réu não pode ser avaliada pela ausência de elementos indicadores nos autos, eis que afeta à índole, senso moral e emocional de cada indivíduo. Os motivos para o cometimento do crime foram inerentes ao tipo penal, agindo unicamente por ganância, o que não justifica a prática delitiva. As consequências extra-penais foram graves em razão da quantia desviada dos cofres públicos e o prejuízo social causado.

Em face disto, verificando que as circunstâncias lhe são desfavoráveis, fixo-lhe a pena-base em 04 (quatro) anos e 06 (seis) meses de reclusão e 50 (cinquenta) dias-multa, fixando cada dia multa em 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato. Torno-a, assim, definitiva em, à falta de outra modificadora. 

Conforme disposto no artigo 33 parágrafo 2º, letra ‘b’, do CPB, fixo-lhes inicialmente o regime semiaberto para cumprimento das penas. Em razão disto, verificando que estão em liberdade e que não é o caso de decretação de prisão preventiva, concedo-lhes o direito de apelar em liberdade. 

As multas, já fixadas, serão recolhidas na forma do que dispõem os artigos 49 e seguintes do CP.

Custas pelos condenados. 
Transitada em julgado a sentença, lance-lhes os nomes no rol dos culpados, (art. 5º, LIV da CF, c/c art. 393, II do CPP), e expeçam-se guias de execução e remetam-se ao Juízo competente para cumprimento das penas.

Publique-se. Lançada a sentença no Sistema Apolo, estará registrada. Intimem-se. Cumpra-se.

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